Pesquisador Sebastião Raulino fala sobre o futuro
do ecossistema; Pescadores artesanais, marisqueiros e catadores de caranguejos
são alguns dos grupos mais atingidos.
Professor
de biologia Sebastião Raulino é um dos membros mais atuantes do Fórum dos
Atingidos pela Indústria de Petróleo e Petroquímica das Cercanias da Baía de
Guanabara. Raulino aponta, nesta entrevista, sua preocupação quanto ao futuro
da Baía.
O professor fez alertas fundamentais sobre o nosso mais belo e
desrespeitado tesouro ambiental, lugar de vida e memórias de populações que
somadas são mais de 10 milhões de pessoas.
Qual é o
quadro social da Baía de Guanabara hoje?
Sebastião
Raulino - A Baía é um corpo hídrico que une diversos municípios do Rio de
Janeiro. Nela, há praias, restingas, costões rochosos, muitos manguezais, Mata
Atlântica, enfim, uma grande diversidade de ecossistemas. Esse cenário vem se
degradando, especialmente, a partir da segunda metade do século XX, com a
industrialização da região, sobretudo com a indústria do petróleo, petroquímica
e química. A industrialização atraiu milhares de trabalhadores desde então.
Assim, devido à falta de investimento em infraestrutura urbana para receber
essa população migrante, surgiram loteamentos precários, sem água, sem esgoto e
com coleta de lixo precária. Tudo isso transformou a Baía num grande receptor
de esgotos domésticos sem tratamento e de efluentes industriais.
E o que
isso causou?
Ao longo do
tempo, nós percebemos a diminuição da qualidade dos rios que deságuam na Baía
de Guanabara, causando sua degradação, o que veio a afetar progressivamente a
qualidade da água da própria Baía e, consequentemente, da fauna e flora. Manguezais,
praias, lagoas foram sendo paulatinamente destruídos. Acompanhando esse
processo, assistimos um quadro desolador criado em relação às populações
tradicionais da Baía de Guanabara.
Poderia ser
mais específico em relação a essas populações?
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Pescadores
artesanais, marisqueiros e catadores de caranguejos são alguns dos grupos mais
atingidos. Esses grupos que, historicamente, subsistem a partir da Baía se
viram frequentemente ameaçados e impedidos de exercer seu trabalho, numa
violação de direitos que vem sendo negligenciada pelo poder público. Esses
grupos vêm decrescendo ano a ano frente ao cenário de violações que vivem. Vale
ressaltar que a perda desses grupos significa a perda de um modo de vida
secular e conhecimentos próprios em relação à própria Baía de Guanabara.
Significa também a perda de sustento de várias famílias e o agravamento de
problemas sociais na região. Repercute também no distanciamento que o modo de
vida de nossa sociedade gera em relação à natureza, mesmo num cenário natural
tão rico como o Rio de Janeiro e a Baía de Guanabara.
O senhor
poderia destacar a indústria do petróleo e petroquímica nesse processo de
degradação?
Nesse
processo, a inauguração da Refinaria Duque de Caxias (REDUC) em 1961 e o polo
petroquímico que se formou ao seu redor são marcos mais importantes. O
vazamento de óleo de 2000, que despejou mais de um milhão de litros na Baía de
Guanabara, também merece ser lembrado, dado ao cenário de degradação e perda de
produção pesqueira que se observou a partir desse episódio.
A intensificação do
modelo petróleodependente no estado do Rio de Janeiro, com o anúncio do pré-sal
e a implantação do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) prenuncia
um cenário de maior pressão ambiental sobre a Baía de Guanabara, retirando da
população a sua possibilidade de escolha sobre qual Baía de Guanabara deseja.
A
sociedade precisa escolher se quer uma Baía transformada em planta fabril,
ocupada por oleodutos, gasodutos, terminais de gás, portos e uma sobrecarga de
navios ligados à cadeia de petróleo ancorada em seu espelho d'água ou se deseja
uma Baía de Guanabara despoluída, com paisagens que sempre foram símbolos do
país, onde diferentes formas de uso sustentável possam conviver nesse espelho
d'água.
02/05/2015 / Por Rogério Daflon / Do Rio de Janeiro
(RJ)
Fonte: Brasil de Fato
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