CONDIÇÕES
DE ENSINO E ATIVIDADE PEDAGÓGICA
Cipriano Luckesi
(Publicado em 07/12/2015)
Prof. CIPRIANO
LUCKESI
Doutor em Educação: Filosofia e
História da Educação
Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo - 1992
"Ainda que componentes da prática educativa
escolar --- condições de ensino e atividade pedagógica --- estejam
intrinsecamente comprometidos entre si, são distintos. Caso não consigamos, a
meu ver, conscientemente praticar essa distinção, pior para a prática
pedagógica na sala de aula, que demanda atenção e cuidados.
“Distinto” não quer dizer “separado”.
Distinto, no caso, quer dizer que --- condições de ensino e a atividade
pedagógica --- são componentes diferentes na prática da educação escolar, ainda
que articulados. E, nesse contexto, que podem e --- creio eu --- devem, por
vezes, ser abordados conjuntamente e, por vezes, ser abordados por focos e
momentos diferentes.
Por condições de ensino, vamos compreender as
políticas públicas voltadas para a educação escolar; as condições físicas e
materiais de nossas escolas (prédio escolar, mobiliário escolar, biblioteca,
recursos necessários para a gestão da escola, manutenção dos prédios,
manutenção dos espaços físicos para atividades como merenda escolar, sanitários...);
política de contratação de profissionais para a educação; recursos materiais de
ensino; a manutenção e salários dos professores; entre outras. Por prática
pedagógica, vamos compreender o que ocorre e deve ocorrer no espaço escolar
como um todo: pátios, jardins, campos de esporte, corredores, sanitários...; e,
sem sombra de dúvidas, especificamente, dentro das salas de aula, lugar onde
educadores e educandos investem nos atos de ensinar-aprender conteúdos
curriculares, cognitivos, afetivos e psicomotores.
No caso, nós, profissionais do ensino,
necessitamos estar atentos aos dois grupos de componentes da prática
educacional escolar, seja àqueles que se destinam a subsidiar condições para o
ato pedagógico, seja àqueles que se destinam ao ato pedagógico propriamente
dito.
Ainda que esses componentes estejam
comprometidos com todos os educadores, as instâncias que respondem por esses
componentes dão-se em espaços físicos e administrativos diferentes.
Não tem como reivindicar melhores condições
de ensino e de salários dentro das salas de aula, enquanto praticamos a
docência; como, por outro lado, não temos como ministrar aulas aos nossos
estudantes nas reuniões dos nossos sindicatos ou nas reuniões dos grupos
organizados da sociedade civil (partidos políticos, sociedades civis,
igrejas...). Em síntese, ainda que articuladas, as atividades
organizativas/reivindicatórias e as atividades pedagógicas dão-se em espaços e
momentos organizacionais diferentes.
Acredito que devemos manter e sustentar nosso
movimento organizado para garantir condições satisfatórias para a educação
escolar, como também devemos nos mobilizar para que nossos atos pedagógicos se
realizem com a melhor qualidade possível. Não podemos realizar nossas
reivindicações por melhores condições de ensino no espaço da sala de aula, em
si; por outro lado, também não podemos dar aulas, comprometidas com o currículo
escolar, nos espaços socialmente destinados às atividades de organização da
categoria profissional, ou de organizações políticas.
Em síntese, a meu ver, ainda que esses
componentes --- condições de ensino e ato pedagógico --- existam de modo
articulado, são distintos e merecem tratamentos distintos em espaços distintos.
A sala de aula não será o lugar mais adequado para o ativismo político e
social, como também as organizações da sociedade civil e os sindicatos não
serão espaços para atividades didático-pedagógicas curriculares.
Desse modo, vamos reivindicar melhores e mais
adequadas condições para o ensino (necessitamos delas, com certeza) e vamos
atuar pedagogicamente na sala de aula, para que nossos educandos aprendam, da
melhor forma possível, aquilo que necessitam aprender, configurado nos
currículos escolares.
No contexto dessa compreensão, a meu ver,
nossa militância política e a militância no espaço de nossa categoria
profissional se darão nos espaços das organizações da sociedade civil e nos
sindicatos; nossa atividade pedagógica se dará dentro da sala de aula.
A meu ver, ainda que sejamos o mesmo sujeito,
com a mesma formação e a mesma postura político-social, esses dois tipos de
atuação estarão se dando em espaços distintos e com finalidades distintas.
Então, cabe a pergunta: que papel político
exerce a sala de aula sobre a cidadania, se ela atua, de modo distinto, ainda
que não separado, da busca de melhores condições para o ensino?
No espaço interno da sala de aula, não haverá
eco nem possíveis respostas para nossas reivindicações. Nossos estudantes não
poderão responder a elas. Então, alguém poderá dizer: “Mas, estarão do nosso
lado”. E eu diria: “Do nosso lado, mas sem cumprir o que vieram fazer dentro da
sala de aula, que é aprender os conteúdos curriculares, tendo em vista se
formarem como sujeitos e cidadãos”.
Então, poder-se-á, revidar mais uma vez:
“Como aprenderão a ser sujeitos e cidadãos com os conteúdos curriculares?”
Então, retorno ao que sinalizei na terceira parte do último post deste perfil
no Facebook --- “Aprendizagem e operação conjunta dos três segmentos funcionais
do cérebro” ---, onde propus que importa ao educador atuar em sala, integrando
todos os segmentos funcionais do cérebro ou com as três camadas embrionárias,
de modo integrado e harmônico. Desse modo, cada conteúdo do ensino-aprendizado
será a base para a formação do sujeito e do cidadão como um todo. Conteúdos
ensinados e aprendidos dessa forma subsidiarão cada estudante para ser o que
deve ser em sua vida adulta.
Então importa, como educadores, tanto
investirmos significativamente nas instâncias reivindicatórias como na sala de
aula. Como educador, sempre participei das duas instâncias; hoje, na condição
de professor aposentado, menos na sindical. Como estudioso e pesquisador, ainda
que sempre tivesse presente os componentes condicionantes do ensino,
dediquei-me a compreender e a encontrar entendimentos, como também práticas,
que dessem suporte à atividade pedagógica; daí que meus escritos e comunicações
estejam mais focados nessa faceta do ensinar-aprender.
Esse posicionamento tem um significado. Não
será a primeira vez que estarei tocando nesse tema, assim como tocaram outros
pesquisadores em educação, tais como Carlos Roberto Jamil Cury, Dermeval
Saviani, José Carlos Libâneo, entre outros. Também já escrevi sobre esse tema
em outras ocasiões.
A educação, por si, não salva a sociedade;
nem, por si, é o seu único reprodutor. Ele se dá no seio da trama de todas as
interações sociais e, desse modo, tanto pode colaborar para a reprodução
social, como pode atuar a favor de sua transformação. Dependerá da filosofia
que seja traduzida através dos atos pedagógicos diários.
Como outros --- e creio estar acompanhado dos
autores que citei acima e, de mais um, o militante político Antônio Gramsci –-
acredito que uma educação, onde os educandos “aprendam a conhecer” (aquisição
de conhecimentos emergentes das diversas áreas científicas e culturais),
“aprendam a fazer” (fazeres práticos necessários ao cotidiano e à
sobrevivência), “aprendam a viver juntos” (aprendizagem da convivência e do
respeito ao outro e ao diferente, seja pela etnia, nacionalidade, religião,
país...), e, por último “aprendam a ser” (aprendizagem que, em cada ato,
integra segmentos cerebrais reptiliano, límbico e neocortex, num todo de
cognição, afeto e ação) (nota 01).
E, então, educandos que efetivamente se
apropriem de aprendizagens com as qualidades indicadas pelos educadores,
reunidos pela Unesco, tendo em vista traçar objetivos para a educação no século
que se iniciava, terão em suas mãos recursos que contribuirão para a busca da
equalização social. A educação escolar, com a qualidade satisfatória em termos
das aprendizagens dos educandos, não fará sozinha a transformação social, mas
será um dos fatores importantes para tanto.
Daí o fato de tantos pesquisadores em
educação investirem no âmbito da compreensão e da prática pedagógica, como eu,
ao lado de muitos outros que investem no âmbito das condições de ensino. Há
lugar para todos e necessitamos de todas essas contribuições para compreender e
atuar em educação."
___________
(01)
Ver o texto “Educação: um tesouro a descobrir”, relatório da Unesco para a
educação do século XXI, para a elaboração do qual representantes de educadores
do mundo todo se reuniram para traçar uma direção para o século que estamos
vivendo, onde estão indicados esses quatro objetivos, aqui mencionados.
Acesse o Site Oficial do
Prof. Dr. Cipriano Luckesi
Fonte: (Compartilhado do Perfil da Rede Social Facebook do Autor)
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Grato, Luciano Egidio. Abraço. Cipriano Luckesi
ResponderExcluirSinto-me muito honrado em poder transcrever para o meu blog essa importante publicação de sua autoria, prezado Professor Cipriano Luckesi. Abraço, Luciano Egidio.
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