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quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Pesquisa desvenda causa da Esclerose Lateral Amiotrófica.

Descoberta recente aproxima doença do “desafio do balde de gelo” da possibilidade de cura.

Rio de Janeiro. Doença que vem recebendo grande atenção nos últimos anos – especialmente com o “desafio do balde de gelo”, que tomou a internet em 2014 –, a Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) está mais perto do que jamais esteve de uma possibilidade de cura. Um dos grandes obstáculos para entender como essa doença neurodegenerativa surge é o fato de os cientistas não saberem que tipo de relação entre as células faz os neurônios motores morrerem.
O mistério, porém, terminou nesta segunda. Pesquisadores da Escola de Medicina da Universidade da Carolina do Norte, nos EUA, divulgaram a primeira descrição científica de como as proteínas neuronais se aglomeram em um composto tóxico que torna a célula doente e, por fim, a mata.
Publicado na edição online da revista “Proceedings of the National Academy of Sciences”, o estudo é considerado um passo crucial para o desenvolvimento de drogas que possam interromper a formação desses aglomerados e deter a progressão da doença, que costuma ser severa. Pacientes com ELA sofrem paralisia e morte precoce, em consequência da perda de neurônios motores, que são essenciais para se mover, falar, engolir e respirar.

Medicamentos

Com o mistério sobre o surgimento da doença aparentemente resolvido, cientistas se mostram esperançosos com a possibilidade de um controle sobre este e outros males neurodegenerativos. “Um dos maiores enigmas da saúde tem sido como lidar com doenças neurodegenerativas. Ao contrário de muitos tipos de cânceres e outras condições, nós não temos, no momento, qualquer poder contra essas doenças”, destacou o autor sênior do estudo, Nikolay Dokholyan, professor de bioquímica e biofísica na Universidade da Carolina do Norte.
A pesquisa se concentra em um subconjunto de casos de ELA que estão associados a mutações em uma proteína conhecida como SOD1. Os pesquisadores descobriram que a SOD1 cria aglomerados temporários de três moléculas, conhecidos como trímeros, capazes de matar células neuronais motoras cultivadas em laboratório.
“Sabendo como esses trímeros são, podemos tentar projetar drogas que iriam impedir a formação deles ou sequestrá­los antes que eles possam causar danos. Estamos muito animados com as possibilidades”, disse Elizabeth Proctor, autora principal do estudo.
A relação entre a ELA e mutações da proteína SOD1 foi observada ainda no início dos anos 1990. Entretanto, a forma exata pela qual a proteína se agregava demorou mais de duas décadas para ser identificada. Para desvendar o mistério de como é a aparência desses aglomerados e como eles afetam as células, a equipe de pesquisa usou uma combinação de modelagem computacional e experimentos em células vivas. Elizabeth passou dois anos desenvolvendo um algoritmo personalizado para determinar a estrutura dos trímeros.
Uma vez que a estrutura dos trímeros foi estabelecida, a equipe passou vários anos desenvolvendo métodos para testar os efeitos dos trímeros em células neuronais motores cultivadas em laboratório. Os resultados foram claros: proteínas SOD1 que se ligaram em trímeros foram letais para as células neuronais motores, enquanto as outras proteínas SOD1 não prejudicaram o organismo.
Daqui para frente, a equipe pretende investigar a “cola” que mantém as trímeros unidos, a fim de encontrar drogas que possam separá­los ou evitar que eles se formem.

ELA no Brasil

Dados. No Brasil, há 12 mil casos de ELA, segundo a Associação Brasileira de Esclerose Lateral Amiotrófica (Abrela). A doença costuma afetar pessoas acima dos 50 anos, sem causa definida.

Multidisciplinar
Como ainda não há cura, o tratamento da ELA deve ser multidisciplinar e envolver profissionais das seguintes áreas:

Neurologia Para avaliar as funções dos neurônios motores e prescrever medicação.

Fisioterapia e terapia ocupacional Para ajudar na mobilidade do paciente.

Nutrição Para acompanhar a alimentação, que poderá ser feita por meio de sondas.

Cardiologia Porque o paciente pode ter suas funções cardíacas comprometidas.

Psicologia Para ajudá-lo a encarar com a mente sã as dificuldades da doença.

Importante também para outras doenças

Rio de Janeiro. Além de ser um passo fundamental nas investigações sobre a ELA, esta descoberta pode, de acordo com os autores do estudo, ajudar a lançar luz sobre outras doenças neurodegenerativas. A clareza sobre como as proteínas neuronais se aglomeram em um composto tóxico que torna a célula doente e, em seguida, a mata, pode auxiliar a desvendar mistérios relacionados a males como o de Alzheimer e o de Parkinson, entre outras doenças.

“Há muitas semelhanças entre as doenças neurodegenerativas”, ressaltou o professor de Bioquímica e Biofísica na Universidade da Carolina do Norte Nikolay Dokholyan. “O que nós encontramos aqui parece corroborar o que já se sabe sobre o Alzheimer, e se pudermos descobrir mais sobre o que acontece na ELA, existe potencial para compreender as raízes de muitas outras doenças neurodegenerativas”.

Identificar a doença é primeiro obstáculo

Rio de Janeiro. Antes de enfrentar o desafio de sobreviver, o primeiro obstáculo do portador da ELA é ter o diagnóstico, que demora pelo menos um ano para ser feito por poder ser confundido com outras doenças neuromotoras, como Alzheimer e Parkinson.

“Muitos casos de ELA passam primeiro no ortopedista, mas é o neurologista que tem habilidade para detectar suas características já no exame clínico (no consultório) e pedir os exames necessários que indicarão a doença”, diz o neurologista José Luiz Pedroso, professor afiliado do Departamento de Neurologia da Unifesp. Um método chamado eletroneuromiografia avalia por meio de estímulos elétricos de baixa intensidade – como pequenos choques – os nervos e os músculos, com auxílio de agulhas, mas o procedimento pode ser doloroso.

Raro. Portador da doença mais conhecido mundialmente, o físico britânico Stephen Hawking, 73, descobriu o problema aos 21 anos. Na época, os médicos chegaram a dizer que ele teria apenas alguns anos a mais de vida. Hawking, no entanto, não só superou as sombrias previsões como se tornou um dos cientistas mais respeitados do mundo depois do diagnóstico, apesar das limitações físicas impostas pela ELA. Sua história foi contada no filme “A Teoria de Tudo” (2014), de James Marsh.

No ano passado, o “desafio do balde de gelo”, proposto para levantar fundos para a ALS Association, que combate a ELA, viralizou na internet e foi responsável por arrecadar US$ 115 milhões para a instituição norte-americana.

(O TEMPO - Saúde e Ciência)




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