Um índio da tribo krenak, cujos membros vivem principalmente
entre os Estados de Minas Gerais e Espírito Santo, dorme há um mês ao relento
numa praça movimentada de Ipanema, no Rio de Janeiro. Ele explica o motivo:
"lama, moço".
Sentado sob uma árvore, em frente à estação General
Osório, do metrô, Gerson Marlon conta que trabalhava como "meeiro"
numa fazenda da região da barragem de resíduos de mineração de Fundão - que
rompeu em novembro e espalhou uma mancha química que cobriu rios, fazendas,
vilarejos e já alcança a região do arquipélago de Abrolhos, na Bahia.
A relação de trabalho de meeiros como Marlon é precária e
geralmente não inclui qualquer vínculo formal de trabalho. Eles geralmente
assumem o trabalho braçal em terras pertencentes a fazendeiros e repartem com
os donos da terra o resultado da produção - daí o termo, vindo do verbo
informal "meiar" (dividir).
"Fui buscar uma vaca que estava faltando no fim da tarde,
no dia 5 (de novembro). Toquei o berrante umas oito vezes e pensei: 'não vou
tocar mais pra ela deixar de ser besta'. A vaca não apareceu e eu tive que
procurar. Quando cheguei no alto do morro, tudo estava diferente. Onde tinha
pasto, casa e plantação, era lama e gente gritando. A vaca estava morta. Morta
embaixo do minério."
"O fazendeiro perdeu fazenda e eu perdi trabalho",
prossegue o índio, de 44 anos, que vive longe da reserva Krenak desde as mortes
da mãe (picada por um barbeiro, transmissor da doença de Chagas) e do pai
("bebia muito e morreu de tristeza sem ela").
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