A falta de fornecimento de água
seguro, adequado e confiável para os setores altamente dependentes de recursos
hídricos resulta na perda ou no desaparecimento de empregos e pode limitar o
crescimento econômico mundial nos próximos anos, “a menos que exista
infraestrutura suficiente para gerenciar e armazenar a água”. O alerta é feito
hoje (22), Dia Mundial da Água, pela Organização das Nações Unidas (ONU).
A edição de 2016 do Relatório
Mundial das Nações Unidas para o Desenvolvimento de Recursos Hídricos é
produzido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (Unesco), em nome da ONU Água. Com o tema a água e o emprego, ele
mostra que 78% dos empregos que constituem a força de trabalho mundial são
dependentes dos recursos hídricos. “Nós temos algo em torno de 1,5 bilhão de
pessoas no mundo que ainda têm problemas de acesso à água, seja em quantidade
ou em qualidade. Isso afeta o emprego delas também”, disse o coordenador do
setor de Ciências Naturais da Unesco no Brasil, Ary Mergulhão.
A Unesco estima que mais de 1,4
bilhão de empregos, ou 42% do total da força de trabalho mundial, são altamente
dependentes dos recursos hídricos. Entre os setores mais atingidos estão a
agricultura, indústria, silvicultura, pesca e aquicultura, mineração, o
suprimento de água e saneamento, assim como quase todos os tipos de produção de
energia. Esta categoria também inclui empregos em áreas como cuidados de saúde,
turismo e setores de gestão de ecossistemas.
Também foi estimado que 1,2
bilhão de empregos, ou 36% do total da força de trabalho mundial, são
moderadamente dependentes dos recursos hídricos. São setores para os quais a
água é um componente necessário em suas cadeias de valores, como construção,
recreação e transporte.
Desde os anos 80, a captação de
água doce tem aumentado mundialmente em cerca de 1% ao ano, principalmente
devido à crescente demanda em países em desenvolvimento, segundo a Unesco. “A
redução da disponibilidade hídrica vai intensificar ainda mais a disputa pela
água por seus usuários. Isso afetará os recursos hídricos regionais, a
segurança energética e alimentar e, potencialmente, a segurança geopolítica,
provocando migrações em várias escalas”.
Economia verde
Além do aumento da demanda, as
mudanças climáticas são uma ameaça à disponibilidade de recursos hídricos. “A
mudança climática levará, inevitavelmente, à perda de empregos em determinados
setores. Uma abordagem proativa de adaptação por meio de políticas pode
amenizar algumas dessas perdas”.
A criação de oportunidades de
emprego em atividades de mitigação e adaptação e o mercado emergente de
pagamentos por serviços ambientais pode oferecer às populações de baixa renda a
oportunidade de criar um tipo de empreendedorismo, com aumento de renda e
implementação de práticas de restauração e conservação.
“A urbanização acelerada e o
aumento dos padrões de vida, o aumento da demanda por água, alimentos e energia
de uma população mundial em constante crescimento, inevitavelmente, levarão à
criação de postos de trabalho em determinados setores (por exemplo, tratamento
municipal de águas residuais) e à perda de postos de trabalho em outros”, diz o
relatório.
Segundo a oficial do Programa
Mundial das Nações Unidas em Avaliação dos Recurso Hídricos da Unesco na
Itália, Angela Ortigara, as maiores potencialidade de emprego estão
relacionadas com a economia verde. “Há todo um trabalho para capacitar os
empresários para essa transição econômica”, afirma.
A produção de energia, por
exemplo, como um requisito para o desenvolvimento, possibilita a criação de
empregos diretos e indiretos por todos os setores econômicos. Segundo a Unesco,
o crescimento no setor de energia renovável leva ao crescimento do número de
empregos verdes e independentes de recursos hídricos. “Podemos dizer que a
geração de energia eólica e solar já cria mais empregos do que a de fonte
convencional”.
Questões de saúde e gênero
Segundo o relatório,
investimentos em saneamento e em água potável de qualidade fomentam o
crescimento econômico, com altos índices de retorno. “O acesso ao suprimento de
serviços seguros e confiáveis de saneamento e de água potável de qualidade, nas
casas e nos locais de trabalho, em conjunto com a higiene adequada, são
essenciais para se manter uma força de trabalho saudável, educada e produtiva”.
A Unesco destaca as questões de
direitos humanos, economia verde, desenvolvimento sustentável e gênero, a serem
consideradas pelos gestores de políticas públicas ao tratar das relações entre
recursos hídricos e trabalho. “Anualmente, 2,3 milhões de mortes são
relacionadas ao trabalho. Doenças contagiosas ligadas ao trabalho contribuem
para 17% dessas mortes e, nessa categoria, os principais fatores para a
proliferação dessas doenças, mas que podem ser evitados, são água potável de
baixa qualidade, saneamento inadequado, falta de higiene e falta de
conhecimento”.
Segundo o relatório, cerca de 2
bilhões de pessoas necessitam de acesso a melhor saneamento, com as meninas e
as mulheres em situação ainda mais precária. Ortigara diz que isso se deve ao
fato de que, em lugares sem infraestrutura, as mulheres são responsáveis pela
coleta de água e destinação das fezes, ou quando precisam sair de casa e se
afastar da comunidade para cuidar da higiene, muitas vezes sofrem violências
nesses percursos.
“E não estamos falando só de
zona de guerra”, disse a oficial, sobre os problemas relativos à água,
saneamento, higiene e emprego. Ela conta que um estudo feito em Bangladesh, com
a distribuição de absorventes íntimos em uma empresa onde 80% dos empregados
eram mulheres, diminuiu as faltas ao trabalho de 73% para 3%.
Políticas públicas
O relatório da Unesco recomenda
que cada país, conforme a sua base de recursos, potencialidades e prioridades,
identifique e promova estratégias específicas e coerentes, bem como planos e
políticas para alcançar o equilíbrio ideal entre os setores da economia e gerar
o melhor resultado possível de empregos decentes e produtivos, sem comprometer
a sustentabilidade dos recursos hídricos e do meio ambiente.
“Com vistas a promover o
crescimento econômico, a redução da pobreza e a sustentabilidade ambiental, deve-se
considerar os métodos que reduzem a perda de empregos ou o deslocamento de
pessoas, além daqueles que maximizam a criação de empregos resultantes da
implementação de uma abordagem integrada na gestão dos recursos hídricos”,
acrescenta o relatório.
Edição: Graça Adjuto
Andreia Verdélio - Repórter da Agência Brasil
(EBC)
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