Amanhecer/Reprodução
Na urgência do debate, nesta quarta-feira (29),
centenas de cidades amanheceram com ações da campanha "Redução Não é a
Solução"
29/04/2015 / Por Simone Freire / Da Redação
Seguindo a
onda das pautas conservadoras que avançam no Congresso neste ano, a discussão
sobre a imputabilidade penal voltou à tona neste mês, após a aprovação da
Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 171/1993, na Comissão de Constituição e
Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados. O texto, que propõe a
redução da maioridade penal de 18 para 16 anos de idade, expôs a urgência do
debate na sociedade e motivou uma série de ações pelo país.
Entre debates
e audiências públicas, nesta quarta-feira (29), diversas coletivos promoveram o
"Amanhacer contra a Redução", como parte da campanha "Redução
Não é Solução". Ao todo, 23 estados acordaram com o colorido das faixas,
cartazes, fitas e símbolos em praças e locais públicos contra proposta.
Iniciada no
Rio de Janeiro, as ações tomaram o Brasil após a articulação com outros
coletivos. "As pessoas estão bem animadas de poder ajudar em uma coisa que
elas acreditam. A redução não é eficiente, não é a solução. Tem muita gente que
nem participa ativamente de movimentos sociais, não trabalha na ação política
diretamente, mas está muito animada de poder dar esta contribuição",
relata a estudante Morena Pérez Ribeiro, que integra a campanha.
Exemplo
uruguaio
A mobilização
brasileira tenta seguir alguns dos motes da campanha "No a La Baja",
que no Uruguai, conseguiu mudar a opinião pública e impedir a redução da
maioridade penal. Em 2011, antes da campanha, cerca de 70% dos uruguaios
apoiavam a redução da inimputabilidade penal de 18 para 16 anos. Um plebiscito
foi realizado em outubro de 2014, e quando a população foi às urnas, 53%
disseram "não" à proposta.
"A
campanha que aconteceu no Uruguai foi muito bonita e muito bem sucedida. Ela
mostra como é possivel mobilizar um país inteiro", diz Morena.
Embora os
países tenham contextos próprios, os problemas com o sistema prisional e a
vulnerabilidade da juventude afetam a realidade tanto dos brasileiros quanto
dos uruguaios. Andrés Risso, do ProDerechos, um dos coletivos que encabeçaram a
campanha no Uruguai, conta que antes a maior parte dos uruguaios achava que a
insegurança era o principal problema do país e que, por isso, a redução era a
solução.
Outro ponto
em comum levantado por ele foi o papel da mídia na discussão, uma vez que, em
horários de pico, mostrava-se muito mais os crimes cometidos por crianças do
que por adultos. "Então toda a população identificava toda a violência com
a adolescência. Esta conexão era muito forte. Por isso que a proposta tinha
muito apoio no começo. Nosso objetivo era acabar com esta conexão porque o
assunto era muito mais complexo", explica.
Responsabilidade
e impunidade
Segundo
levantamento publicado pela Rede ANDI Brasil, que atua com direitos da criança
e do adolescente, apenas 4%, dos mais de 20 milhões de jovens brasileiros,
estão em situação de conflito com a lei. Os dados mostram que não se pode fazer
uma relação direta entre pobreza e criminalidade.
No entanto,
as mesmas pesquisas concluem que a maioria dos que cometeram infrações foram
expostos a uma série de falhas institucionais e sociais que, de uma forma ou de
outra, os expuseram a situações de violência, seja como vítimas ou autores.
Ao limitar
o debate à restrição ou não da liberdade destes jovens, o Estado e a sociedade
são retirados de sua responsabilidade, que, segundo o artigo 70 do Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA), é prevenir "a ocorrência de ameaça ou
violação dos direitos da criança e do adolescente”. Este é um dos apontamento
feitos pela professora e pesquisadora da Pontifícia Universidade Católica do
Rio de Janeiro (PUC-RJ), Irene Rizzini.
Ela, que
também é diretora do Centro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a
Infância, aponta que "colocar no ombro deste menino e desta menina o ônus
de todas estas falhas nossas enquanto sociedade é absolutamente equivocado”.
“Se vamos
falar de punir, vamos falar de punir também os adultos que aliciam, os
policiais que batem, os traficantes que levam, ou mesmo os pais que não
conseguem dar conta e não conseguem dar apoio. São os adultos no entorno da
vida dele, em primeiro lugar - ou que precisam de apoio ou que precisam ser
coibidos em atividade ilegais - que impactam sobre o bem estar desta
população", argumenta.
Ao mesmo
tempo, para a professora, ser contra a redução não quer dizer ignorar que tais
jovens cometeram crimes e que saiam impunes das suas ações. "Se trata de
absolutamente recusar que a solução para isso seja a punição como se fossem
adultos", diz.
Novas ações
A
complexidade da questão sobre a imputabilidade penal requer toda a atenção e
cuidado da sociedade. Para Irene, embora deva-se tomar cuidado para não se
limitar entre o "sou à favor" ou o "sou contra", as
mobilizações atuais são importantes, pois conseguiram ocupar maior espaço na
mídia e abre um caminho para discutir, por exemplo, melhorias nas políticas
públicas para esta faixa etária.
Neste
sentido, segundo Morena, as ações da campanha "Redução Não é
Solução", devem continuar para ampliar a discussão com a sociedade e na
luta por conquistas.
Da
experiência de sucesso no Uruguai, Rizzo, do ProDerechos, acredita em uma
aliança cada vez maior no Brasil sobre o tema. "Eu acho que o melhor
conselho é expandir o máximo possível este debate. Eu sei que o Parlamento no
Brasil agora está muito conservador, mas se a população muda, a pressão é
possível. Acho que o Brasil tem a possibilidade de uma rede muito forte em
todos os eixos", afirma.
Fonte: Brasil de Fato
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